sol2070@velhaestante.com.br apžvelgė autoriaus Ramos, Graciliano knygą Vidas secas
Obra-prima acessível
5 žvaigždutės
( sol2070.in/2025/09/vidas-secas-graciliano-ramos/ )
O clássico Vidas Secas (1938, 176 pgs), de Graciliano Ramos, surpreende pela atualidade: não deixa de ser uma ficção climática, de subjetividade narrativa impressionante.
A experiência das pessoas de uma família nordestina muito pobre é transmitida do modo como elas sentem (apesar de ser na terceira pessoa), incluindo a cadela Baleia. Ela não é relegada como mero animal, mas aparece como um ser que sente, deseja e sonha como as pessoas. Hoje, quase 90 anos depois, tal inclusão de outros seres sencientes na ficção ainda é rara.
Não é à toa que muitas das edições trazem Baleia na capa. Seu capítulo-chave foi uma das passagens mais marcantes e emotivas que já experimentei na literatura.
Essa equalização entre não humano e humanos também é possível devido à condição social da família. O pai Fabiano, por exemplo, não conhece palavras suficientes nem para dizer o que quer, sente ou …
( sol2070.in/2025/09/vidas-secas-graciliano-ramos/ )
O clássico Vidas Secas (1938, 176 pgs), de Graciliano Ramos, surpreende pela atualidade: não deixa de ser uma ficção climática, de subjetividade narrativa impressionante.
A experiência das pessoas de uma família nordestina muito pobre é transmitida do modo como elas sentem (apesar de ser na terceira pessoa), incluindo a cadela Baleia. Ela não é relegada como mero animal, mas aparece como um ser que sente, deseja e sonha como as pessoas. Hoje, quase 90 anos depois, tal inclusão de outros seres sencientes na ficção ainda é rara.
Não é à toa que muitas das edições trazem Baleia na capa. Seu capítulo-chave foi uma das passagens mais marcantes e emotivas que já experimentei na literatura.
Essa equalização entre não humano e humanos também é possível devido à condição social da família. O pai Fabiano, por exemplo, não conhece palavras suficientes nem para dizer o que quer, sente ou para encadear pensamentos com mais lógica. As crianças, quando visitam uma cidade pela primeira vez, vendo produtos, estátuas e arquiteturas que nunca nem ouviram falar, imaginam que estão diante de algo inimaginável, que não pode ter sido feito por gente.
O livro começa com a família — duas crianças e dois adultos — vagando sem quase nada por um sertão castigado pelo clima extremo. Uma das poucas refeições que conseguem é a própria Baleia que traz: um preá que ela caça e traz para as pessoas que ama. No início, é um retrato tão árido e realista que quase repele, do mesmo modo como fazem documentários ou reportagens sobre os aspectos mais monstruosos da desigualdade. Mas a proeza literária da narrativa segura.
A fluidez é outro fator que mantém o livro moderno. O estilo é seco e direto, talvez mimetizando a expressão das personagens, mas não dificulta em nada a leitura, pelo contrário — com a exceção de algumas palavras pouco usadas e mais comuns no sertão.
Apesar da escrita objetiva e concisa, mais comum na “narração indiferente”, que não entra nas subjetividades pessoais, o autor nos transporta com facilidade para dentro.
Apesar do tom trágico e de denúncia — que apenas desvela que essas outras pessoas não são essencialmente diferentes de quem lê —, não é só desgraça. O afeto é tão essencializado, sem máscaras, que logo torna a leitura uma experiência intensamente emocional. Há até algum humor.
Vidas Secas é uma das raras obras-primas bem acessíveis. Não exige muito mais do que eventuais consultas ao dicionário para termos da vida no sertão antigo. Também tem apenas 120 páginas (na edição da Record, mais de 50 páginas são dedicadas a referências e um ensaio sobre o livro).